Apesar de ser geralmente rotulado como
comédia, Um estranho vampiro (também conhecido pelo título alternativo O beijo do vampiro)
é uma produção que eu acredito que vai além dessa classificação simplista,
tanto pelo roteiro extravagante quanto pelo próprio estilo de humor centrado
nos efeitos de um grave transtorno mental.
Dirigido por Robert Bierman , o filme
já começa com Peter Loew (o personagem de Cage) numa sessão de terapia com sua
psiquiatra, o que já dá uma pista da instabilidade mental dele, que só aumenta
ao longo da história, culminando com sua crença de que se tornou um vampiro.
Loew trabalha numa agência literária e a perda do contrato de um cliente
funciona como gatilho para deixá-lo mais desequilibrado e esquisito do que ele
já é. A partir daí ele passa a pressionar sua secretária, Alva (Maria Conchita
Alonso), para que ela encontre tal documento. A pressão vai se agravando,
tornando-se perseguição e assédio em situações cada vez mais bizarras, onde
Loew não fica devendo muito a Jack Nicholson em O Iluminado, em termos de
loucura desenfreada. O humor do filme é justamente sustentado pela atuação
alucinada de Nicolas Cage nessas situações sem noção, onde ele faz um bocado de
caras e bocas (que, inclusive, se tornaram memes nas redes sociais), enquanto
seu personagem se deixa consumir rapidamente por um comportamento neurótico e
esquizofrênico.
A abordagem do vampirismo deste filme
lembra muito o trabalho de George Romero em Martin (comentado AQUI); em ambos os casos
trata-se de uma condição patológica relacionada a distúrbios psicológicos. Em
Martin, o personagem-título crê ser vampiro devido a uma maldição da família,
enquanto em Um estranho vampiro (considero este título bem apropriado) o
estresse do trabalho somado à convicção de que foi mordido por uma vampira num
encontro casual pouco depois de “lutar” com um morcego que invadiu seu
apartamento, resultam na condição vampiresca de Loew. Também os finais dos dois filmes são muito
parecidos, com resultados trágicos para os transtornos dos protagonistas.
Mesmo que o elemento vampiresco
presente neste filme seja essencialmente psicológico, acho que é uma produção
que merece ser conferida, pois faz referências aos mais diversos elementos do
universo dos sugadores. Loew chega ao cúmulo de usar uma dentadura de vampiro
de plástico, quebrar os espelhos de sua casa, vedar as janelas para que a luz
solar não entre e até a improvisar um caixão emborcando um sofá para dormir
embaixo dele. Isso sem falar na “estaca” que ele passa a carregar, como uma
penitência por sua natureza vampírica, já próximo do final. E, como cereja do
bolo, ele ainda assiste ao Nosferatu, de Murnau.