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[LIVRO] ENTREVISTA COM O VAMPIRO (Interview with the Vampire, 1976)

domingo, 8 de julho de 2018.

Anne Rice é incontestavelmente a rainha da literatura gótica/fantástica moderna, reconhecimento conquistado por suas obras sombrias e sensuais, particularmente As Crônicas Vampirescas, das quais Entrevista com o vampiro é o primeiro volume. Resgatando alguns elementos das histórias tradicionais (vampiros de beleza hipnótica que dormem em caixões e queimam ao sol) e desconsiderando outros (estacas no peito, intolerância a símbolos religiosos, capacidade de se transformar em animais ou névoa), Rice constrói um romance grandioso (não em extensão, mas em profundidade), dando uma dimensão filosófica e poética ao vampirismo raramente vista na literatura do gênero.
O título do livro é autoexplicativo: a obra é predominantemente narrada em 1ª pessoa pelo vampiro Louis de Pointe du Lac, que conta a um repórter sua conturbada existência imortal desde as origens, no século XVII. Nessa época ele tinha pouco mais de vinte anos de idade e estava passando por uma forte depressão motivada por uma tragédia na família (tragédia essa que não é a mesma mostrada na adaptação para o cinema). É então que Lestat de Lioncourt cruza o caminho de Louis e muda seu destino mortal para sempre.
          Lestat é apresentado como ardiloso e sedutor, manifestando por Louis um interesse duplo: primeiro, apossar-se de suas terras; paralelamente, deseja obter um companheiro e “amante” eterno, uma vez que se sente fortemente atraído pela beleza e o sentimentalismo de Louis. A propósito, um aspecto marcante na obra de Anne Rice, presente também nos demais volumes, é a fascinação pela beleza, seja a dos vampiros que seduzem os mortais, seja a dos humanos que encantam os imortais. Nesse sentido, não é de estranhar o tom sutilmente homoerótico que permeia a obra.
          Se Louis remete aos ultrarromânticos byronianos, com todo aquele drama existencial envolvendo o sofrimento e o desgosto de viver, Lestat se encaixa, inversamente, nos moldes hedonistas, preocupado apenas com a satisfação de suas vontades e apetites, bem como pelos demais prazeres que acompanham a imortalidade.
          Entrevista com o vampiro é parcialmente resultado de uma experiência traumática da autora: a perda de sua filha, morta ainda criança em decorrência da leucemia. O livro representa essa filha alegoricamente na forma da pequena Cláudia, a criança “adotada” por Louis e Lestat e transformada em vampira por eles.
          Outro personagem interessantíssimo da história (e, particularmente, o meu personagem favorito das Crônicas) é o vampiro Armand, que ganha mais destaque nos volumes seguintes, tendo, inclusive, um livro próprio.  Ele dirige o Teatro dos Vampiros, em Paris; trata-se de um covil de vampiros que “fingem ser humanos que fingem ser vampiros”, atraindo multidões para os espetáculos muitas vezes mórbidos que encenam nos palcos.
          Mesmo sendo o primeiro livro de uma longa série que ainda não foi encerrada, Entrevista com o vampiro pode ser lido sem preocupação imediata com as sequências, pois possui uma história completa: a vida de Louis, de sua transformação até os dias atuais, das descobertas às viagens pelo mundo, está tudo ali. A escrita detalhista e imersiva de Anne Rice, somada à primorosa tradução de Clarice Lispector proporcionam uma leitura fundamental aos fãs dos sanguessugas, sobretudo em se tratando de vampiros que se permitem ser monstros sem deixar de ser aristocráticos.

4 comentários:

Cleuzita disse...

Tá vendo, eu disse que viria visitar seu blog :)
Sabia que você gostava de vampiros, só não imaginava o quanto.
Parabéns, você está fazendo um excelente trabalho aqui.
Um abraço, até mais.

Cleuzita Apontes

Fábio TB disse...

Obrigado pela visita e pelo comentário, Cleuzita! É um ótimo estímulo. :)

Cleuzita Apontes disse...

Olá!
Desejo sucesso pra você!

Fábio TB disse...

Que Lestat te ouça!

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