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[FILME] DRÁCULA DE BRAM STOKER (Bram Stoker's Dracula, 1992)

terça-feira, 28 de agosto de 2018.

Das numerosas adaptações do livro Drácula para as telas (em especial as que estão NESTA LISTA), acredito que este filme de Francis Ford Coppola seja a produção mais representativa e controversa entre os leitores da obra de Bram Stoker. Há aqueles que criticam o filme severamente, acusando-o de distorcer a história do vampiro mais famoso do mundo, transformando-o de morto-vivo cruel e repulsivo a gentleman apaixonado por uma amada reencarnada; nesse sentido, a maior implicância dos leitores está no romance entre Drácula e Mina, coisa que, de fato, não existe no livro. A certa altura da obra escrita o vampiro cria um vínculo com Mina (assim como com outras vítimas), mas é uma ligação de pura dominação mental, não havendo nada de romântico nela. Por outro lado, há aqueles que consideram esta a adaptação “definitiva” do romance clássico: eu fico neste grupo.
Mesmo acrescentando a trama romântica que desagradou tanta gente, o roteiro de James V. Hart é, na minha opinião, o mais fiel ao livro – por mais irônico que possa parecer. Como na obra, o filme segue uma estrutura epistolar, com narrações de Jonathan Harker (Keanu Reeves), Mina Murray (Winona Ryder) e Jack Seward (Richard E. Grant), além de trechos de manchetes – como a sequência sobre a tempestade e o misterioso naufrágio do navio Demeter. O maior mérito desse roteiro em relação ao das outras adaptações é que ele respeita o máximo possível as relações e a presença dos personagens do livro. Geralmente os roteiristas cortam personagens ou "fazem salada" com eles, como em alguns filmes onde Lucy e Mina tem os papéis (e funções) trocados, ou são irmãs, ou Lucy é filha de Jack Seward, ou Arthur e Quincey não existem (ou são uma pessoa só)... enfim: é uma bagunça absurda. Já neste Drácula de Bram Stoker, excetuando a ausência da mãe de Lucy, quase tudo é preservado tal qual na obra original: Mina é amiga de Lucy; Lucy tem os três pretendentes: Arthur, Quincey e Seward; Mina é noiva de Jonathan. Para quê complicar?
          A trama começa com uma sequência inexistente no livro, mas que justifica alguns elementos importantes do filme: uma batalha entre o exército do Drácula “real”, histórico contra os turcos. Dessa batalha resultam a perda de sua amada esposa e a conversão de Drácula em vampiro, numa cena dramática que mostra a origem do vampirismo e o porquê da sua consequente intolerância aos símbolos cristãos.
          A escolha de Gary Oldman como protagonista é tão peculiar quanto acertada. O ator realmente não lembra o personagem do livro e nem os outros Dráculas anteriores do cinema, com cabelo lambido e capa preta; em compensação, parece muito o Drácula histórico, Vlad Tepes, o Empalador, e é exatamente isso que o filme quer ressaltar. Independentemente disso, Oldman apresenta uma atuação inspirada, seja nos momentos em que assombra seus perseguidores e vítimas, seja quando se deixa arrebatar por seu amor à Mina, por quem “cruzou oceanos de tempo”. O elenco de apoio também está impecável, particularmente Anthony Hopkins (que considero o melhor Van Helsing do cinema) e Sadie Frost como a memorável Lucy Westenra. Até personagens menores, como as noivas de Drácula (destaque para Monica Bellucci) estão muito bem situados.
          Nos aspectos técnicos, este filme é um show à parte. A direção de arte na viagem de Jonathan à tenebrosa Transilvânia e nas cenas noturnas na enevoada Londres do século XIX, consegue nos transportar para a atmosfera sombria sugerida pelo livro com perfeição. Além disso, os figurinos exuberantes e a maquiagem de efeitos práticos tornam a experiência de vê-lo ainda mais fascinante.
          Vencedor de 3 Oscars, Drácula de Bram Stoker não só é a melhor versão do romance, como também é meu filme de vampiros favorito de todos os tempos, mesmo que Entrevista com o vampiro, de Neil Jordan, esteja constantemente disputando o posto. Ambos são caprichosas adaptações de excelentes obras literárias que resultaram em espetáculos góticos sensuais: um tributo à essência clássica dos eternos sanguessugas.


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[LISTA] 10 COMÉDIAS COM VAMPIROS

segunda-feira, 20 de agosto de 2018.

Não só de horror e violência vive o cinema vampiresco. Nesta lista estão reunidas, em ordem cronológica, dez produções de diferentes épocas e com diferentes estilos que abordam o tema através da comédia. Alguns dos filmes têm um humor mais sutil, enquanto outros têm um tom satírico mais escrachado.



1. A DANÇA DOS VAMPIROS 
(The fearless vampire killers, 1967)
Direção: Roman Polanski

Neste filme o próprio Polanski (que mais tarde se tornaria célebre por clássicos como O bebê de Rosemary e O pianista) além de dirigir, atua como o jovem e inseguro discípulo de um professor universitário meio biruta que se considera especialista em vampiros. Os dois decidem fazer uma “pesquisa de campo” na Transilvânia e, evidentemente, não demora para eles se meterem em confusão ao se deparar com o temível Conde von Krolock (Ferdy Mayne). O filme é uma paródia dos antigos filmes de vampiros, como os protagonizados por Christopher Lee; além disso, tem a ousadia de introduzir o primeiro vampiro abertamente gay do cinema: Herbert (Iain Quarrier), filho do Conde.


2. AMOR À PRIMEIRA MORDIDA
(Love at first bite, 1979)
Direção: Stan Dragoti

Depois de vários séculos “vivendo” nas trevas da Transilvânia, o Conde Vladimir Drácula (George Hamilton) é despejado de seu castelo pelo governo e indignado, decide ir para Nova York, à procura de seu grande amor: uma top model que ele acredita ser a reencarnação de sua amada de eras passadas. 
George Hamilton está ótimo no papel de um Drácula canastrão, charmoso e apaixonado, desacostumado com os avanços do mundo moderno. Com seu fiel e atrapalhado servo, Renfield (Arte Johnson), essa dupla se envolve em situações hilárias, sobretudo ao enfrentar o obstinado descendente de Van Helsing, noivo da moça cobiçada pelo Conde.


3. PROCURA-SE RAPAZ VIRGEM
(Once bitten, 1985)
Direção: Howard Storm

Este filme é bem a cara dos anos 80 e é impossível não se deixar levar pela música-tema de mesmo nome, do 3-Speed. Apresentando Jim Carrey no começo da carreira, mas com uma ótima atuação, a história gira em torno de uma vampira de 400 anos designada apenas pelo nome “Condessa” (Lauren Hutton). Para se manter jovem e bela, ela precisa realizar um ritual antes do Halloween cujo ingrediente principal é extremamente raro nos dias atuais: sangue de um rapaz virgem! Com a ajuda de seu fiel mordomo (que “saiu do armário” há séculos, mas que de vez em quando entra no da Condessa para experimentar suas roupas de grife), a vampira passa a perseguir Mark (o personagem de Carrey), que, por sua vez, está ansioso para perder a virgindade com sua namorada.


4. VAMP: A NOITE DOS VAMPIROS

(Vamp, 1986)
Direção: Richard Werk

Em muitos aspectos este filme lembra A hora do espanto, possuindo também ideias que evidentemente inspirariam Um drink no inferno uma década depois. É uma mistura de terror adolescente e comédia em torno de alguns jovens que para provarem ser dignos e populares o bastante para fazer parte de uma república de estudantes, precisam realizar uma "missão" num clube de strip-tease. Porém, o que parecia uma noite de diversão excitante logo muda de figura quando os jovens conhecem a exótica dançarina Katrina (Grace Jones), que é, na verdade, a líder de um bando de vampiros que usa o clube como isca para suas vítimas.


5. MEU DOCE VAMPIRO
(My best friend is a vampire, 1987)
Direção: Jimmy Huston

Assim como Procura-se rapaz virgem, este filme reflete bem a década de 1980, sendo ainda mais light e tendo cara de Sessão da Tarde. Na trama, o adolescente Jeremy (Robert Sean Leonard) é mordido por uma vampira e começa a se transformar. Obviamente, ele enfrenta sérias dificuldades para se adaptar a esse novo “estilo de vida”, lidar com os pais e tentar engatar um novo romance. A princípio relutante, ele conta com a ajuda de um vampiro ancião “bondoso”, que lhe orienta a pôr em prática uma perspectiva vampírica alternativa. Porém, novas dificuldades surgem quando um caçador de vampiros totalmente pirado passa a persegui-lo com suas estacas de madeira e balas de prata.

6. BUFFY: A CAÇA-VAMPIROS
(Buffy: The vampire slayer, 1992)
Direção: Fran Rubel Kuzui

Este filme não foi recebido com entusiasmo pelo público e a crítica, mas serviu de base para que, ainda no final da década de 90, Joss Whedon (o roteirista) criasse uma das séries de TV mais queridas de todos os tempos (já comentada AQUI). Kristy Swanson interpreta Buffy, a típica garota fútil que faz parte de um grupo de patricinhas (destaque para Hilary Swank no papel que certamente inspirou a Cordelia da série). De uma hora para a outra, Buffy descobre que tem habilidades especiais e que está predestinada a enfrentar os vampiros que estão infestando a cidade. Com a a orientação de Merrick (Donald Sutherland), ela recebe treinamento para finalmente lidar com Lothos (Rutger Hauer), o líder dos sanguessugas.


7. DRÁCULA: MORTO, MAS FELIZ
(Dracula: Dead and loving it, 1995)
Direção: Mel Brooks

Basicamente uma paródia escrachada dos filmes sobre Drácula, especialmente do “recente” (para a época) realizado por Coppola, esta produção não conhece o significado da palavra sutileza. O maior destaque aqui é, obviamente, Leslie Nielsen como o famoso –  e atrapalhado –  Conde Drácula; por mais pastelão que o filme seja, o ator consegue arrancar boas risadas, principalmente nos embates com Van Helsing (Mel Brooks). Como no filme Amor à primeira mordida, Drácula conta com a ajuda (que mais atrapalha do que é útil) de Renfield (Peter MacNicol) para pôr em execução seus planos tresloucados de sedução, que se reduzem a fracassos sucessivos.

8. A LIGA CONTRA O MAL
(Chin Gei Bin / The Twins Effect, 2003)
Direção: Dante Lam & Donnie Yen

Este filme se diferencia dos demais desta lista de forma inovadora: primeiro, porque se passa na Ásia, especificamente em Hong-Kong, onde ocorre secretamente um constante conflito entre “etnias” de vampiros. Em segundo lugar, a produção não se encaixa simplesmente no gênero comédia: ele mistura humor, ação, terror e romance, indo de cenas tipicamente escrachadas até ótimas sequências de artes marciais, como a que abre o filme. Na história, Kazaf (Edison Chen) é o último de cinco príncipes vampiros perseguidos e destruídos pelo Duque Dekotes (Mickey Hardt), que está prestes a se apossar de um talismã que possibilitará que ele se torne imune à luz solar. Para impedir Dekotes, entram em cena um casal de caçadores de vampiros e a namorada de Kazaf. Destaque para a participação de Jackie Chan.



9. TRANSYLMANIA: UMA UNIVERSIDADE DE ARREPIAR
(Transylmania, 2009)
Direção: David & Scott Hillenbrand

Basicamente um American Pie com vampiros, este filme não agradará quem esperar humor sutil ou roteiro inteligente. A história é absurda e repleta de alusões sexuais banalizadas. Um grupo de estudantes (com todos os estereótipos de estupidez, vício em drogas e sexo) decide cursar um semestre na Universidade de Razvan, na Romênia e acabam caindo nas mãos (e dentes) dos vampiros que habitam a região. Aqui tem um vampiro antigo procurando quebrar um feitiço lançado em sua amada bruxa, um sósia humano azarado desse vampiro, um reitor suspeito com um segredo tão absurdo quanto macabro, no estilo Frankenstein... enfim, é um disparate atrás do outro.


10. GUERRA DOS MONSTROS
(Freaks of nature, 2015)
Direção: Robbie Pickering

Quase tão apelativo quanto Transylmania, este filme consegue ainda assim apresentar algumas ideias interessantes. O título nacional sugere o que ele de fato é: uma paródia parcial de Guerra dos mundos. Na história, a sociedade está organizada numa pirâmide de três camadas onde os seres humanos ocupam a porção central, acima dos zumbis e abaixo dos vampiros. Separados por suas "castas", essas criaturas manifestam preconceito pelos que estão abaixo de sua classe, mas precisarão se unir para enfrentar uma ameaça alienígena que chega à Terra. É um filme bem trash, sangrento e absurdo, mas achei original.
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[FILME] OS VAMPIROS DE SALEM / A MANSÃO MARSTEN ('Salem's Lot, 1979 / 2004)

segunda-feira, 13 de agosto de 2018.

Primeira adaptação do livro A hora do vampiro, de Stephen King (mais detalhes AQUI), esta minissérie foi dirigida por Tobe Hooper (cineasta responsável por clássicos do terror como O massacre da serra elétrica e Poltergeist). Posteriormente, foi editada e relançada em forma de um longo telefilme.
Curiosamente, mesmo sendo tão extensa, essa produção simplificou, modificou e cortou muitos personagens e eventos da história, o que, a meu ver, tornou a experiência de assistir a ela bastante cansativa até mais ou menos a metade. Isso aconteceu porque o roteiro se concentra basicamente no personagem Ben Mears (David Soul) e sua ligação com a mansão Marsten, deixando de lado a grande riqueza de subtramas que poderiam ser exploradas e entrelaçadas, como acontece no livro.  Se se tratasse de um filme de até duas horas, essa simplificação excessiva poderia ser relevada, mas estamos falando de uma obra com 3 horas de duração, o que torna difícil defender essa preguiça do roteiro.
          Entretanto, apesar de esse projeto de Hooper deixar muito a desejar como adaptação, ele tem alguns méritos se analisado como uma produção “original”, ou seja, sem que fiquemos fazendo comparações com o livro. O filme se arrasta muito (com atuações pouco louváveis) até que o clima de apreensão e horror se torne palpável, mas quando isso acontece temos um vislumbre de por que o diretor carrega fama de um dos mestres do gênero. A concepção dos vampiros flutuando na névoa e aparecendo nas janelas é o que há de mais memorável, na minha opinião. A maquiagem dos vampiros, com olhos amarelados, palidez exagerada e caninos longos pode parecer tosca hoje, mas certamente cumpre bem sua função para a época.
        Falando nos vampiros, Hooper inspirou-se claramente no Nosferatu de Murnau para a concepção de seu Barlow. Quem já leu o livro de King, sabe que o “Mestre” é fisicamente semelhante ao Drácula de Bram Stoker, mas neste filme ele está com a aparência grotesca do conde Orlok: careca, com orelhas pontudas, unhas compridas, dentes incisivos longos e tortos. Como diferencial, ele tem a pele bizarramente arroxeada. Outra característica notável é que nesta adaptação ele não fala (algo compreensível, pois seria difícil Reggie Nalder falar com aquela dentadura medonha). Para contornar essa “deficiência”, nos momentos em que ele aparece e diálogos são necessários, ele conta com Straker (James Mason) como intérprete.
          De um modo geral, este Os vampiros de Salem vale a conferida, mas está longe de ser uma das melhores adaptações de Stephen King; além de ter muitas restrições em relação à violência e ao conteúdo impactante do livro, por se tratar de uma versão para TV, ele é muito novelesco e o estilo dos anos 70 não lhe caiu muito bem. Se tivesse sido um filme para cinema, sem o cabresto da censura televisiva da época, acredito que o diretor poderia ter mais liberdade para ousar e torná-lo tão memorável quanto a adaptação de Carrie, a estranha, de Brian De Palma, também dos anos 70, mas que consegue ser infinitamente superior.

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Lançada originalmente como uma minissérie em duas partes, A Mansão Marsten é outra adaptação do livro A hora do vampiro, também convertida para um filme de 3 horas. O título é uma referência à primeira parte do romance e designa uma casa que abriga forças malignas, situada na cidade onde se passa a história. Apesar de tão longa quanto a adaptação de Tobe Hooper, considero esta versão “recente” muito superior e bem menos cansativa que a primeira, tendo um bom elenco e preservando muito mais aspectos do roteiro do livro do que a dos anos 70.
Dirigido por Mikael Salomon, este filme apresenta um Ben Mears (Rob Lowe) bem mais aceitável, jovem e carismático do que David Soul; outro acerto foi dar a Rutger Hauer o papel de Barlow, pois, na minha opinião, ele ficou bem mais condizente do que aquele Nosferatu roxo da primeira versão. Uma curiosidade é que Hauer já foi "vampiro-líder" em outra produção: Buffy: A caça-vampiros, dos anos 90. Outros nomes interessantes do elenco incluem Donald Sutherland como Straker (fisicamente não se parece em nada com o do livro, mas ficou bem melhor do que James Mason) e James Cromwell como o padre Callahan.
         Outro ponto a favor desta versão é que ela manteve algumas subtramas do livro e deu espaço para personagens menores, como o motorista de ônibus rabugento e sua implicância com as crianças; o corcunda amargurado com sua fixação por uma “lolita” que o despreza; a jovem mãe relapsa que espanca seu bebê e a esposa infiel flagrada no ato (neste último caso, as duas tramas foram fundidas). Além disso, deu o destaque merecido ao passado de Ben e sua aventura traumática na Mansão, através de flashbacks de sua infância, mudando alguns fatores, mas entregando o mesmo produto.
          Quanto à abordagem do vampirismo, também não acho que fique devendo à outra adaptação. Os vampiros aqui são pálidos, têm olhos esbranquiçados, caninos longos e algumas habilidades, como flutuar e hipnotizar. Também há as clássicas cenas em que eles aparecem levitando nas névoa, arranhando as janelas das suas vítimas em potencial.
          Por fim, é necessário lembrar que nesta adaptação há cenas consideravelmente sangrentas; pode soar estranho ter que mencionar algo tão óbvio em se tratando de um filme sobre vampiros, mas como na primeira versão a violência e a presença de sangue eram praticamente inexistentes, achei importante frisar esse aspecto.
          Recomendo (principalmente a quem já leu o livro) que se assista às duas versões, mas se tiver que escolher só uma, é esta que eu indico.


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[SÉRIE] TRUE BLOOD (2008 - 2014)

terça-feira, 7 de agosto de 2018.

Indo direto ao ponto: True Blood é, na minha opinião, a melhor e mais original série de televisão com temática vampiresca surgida durante e depois da fase em que os sanguessugas entraram na moda, graças à popularidade das produções em torno dos livros de Stephenie Meyer – entre 2008 e 2012.  Porém, quem conhece a série já sabe que esta produção da HBO está longe de apresentar uma visão teen melosa e politicamente correta sobre os vampiros. Baseada na série de livros The Southern Vampire Mysteries, de Charlaine Harris, True Blood foi concebida por Alan Ball, já premiado por trabalhos aclamados pela crítica, como o roteiro do filme Beleza americana (American beauty) e a série A sete palmos (Six feet under), também da HBO.
Anne Rice, que é incontestavelmente a maior autora viva especializada em escrever sobre vampiros, já declarou seu entusiasmo em relação a essa série. Nas palavras dela, True Blood é um show “inteligente, satírico e profundamente envolvente. É cheio de humor e, no entanto seus personagens possuem cenas tenras e emocionais. Eu acho que ele prende bastante e é muito divertido de assistir. Obviamente ele tem sexo e violência demais para os mais jovens, mas para a audiência adulta é um desenvolvimento fantástico da mitologia vampírica, colocando os vampiros bem no meio do mundo contemporâneo. Eu adoro a série.”.
No universo apresentado em True Blood os vampiros não “vivem” mais escondidos, como era regra até então na maioria das produções. Graças à invenção de um sangue sintético, criado pelos japoneses, eles decidiram “sair do caixão”, isto é, expor-se à sociedade humana, em busca de direitos civis e de uma organização social e política própria. Esse movimento de sair das sombras e assumir publicamente sua natureza vampírica foi chamado de Grande Revelação e foi organizado pela Autoridade (o coração político do mundo vampiresco).  Através da fundação da Liga dos Vampiros da América, a Autoridade divulga na mídia os interesses dos vampiros por uma pretensa coexistência pacífica com os humanos. Nessa função, a política dos vampiros conta com outras funções administrativas: reis (cada Estado possui um) e xerifes (responsáveis por Áreas, regiões menores nas quais os estados são divididos). Além disso, também há um Magistrado, que fiscaliza as atividades e eventuais crimes dos vampiros nessas Áreas, tendo autonomia para puni-los.
A série começa dois anos depois da Grande Revelação, então a existência dos vampiros já é amplamente reconhecida, embora, até aquele momento, nenhum deles tenha aparecido na pequena cidade de Bon Temps, onde se passa a história. É então que Bill Compton (Stephen Moyer) chega à cidade, sendo rapidamente reconhecido como um vampiro pela protagonista Sookie Stackhouse (Anna Paquin, ganhadora do Globo de Ouro pelo papel). Sookie é uma garçonete com poderes telepáticos que são um tormento para sua vida social, pois ela está sempre com a cabeça repleta das “vozes” dos pensamentos das pessoas à sua volta, captados involuntariamente. Isso faz com que ela seja vista pela população de Bon Temps como uma criatura estranha. Entretanto, ao conhecer Bill, ela se apaixona por ele e descobre que não consegue ler seus pensamentos, assim como de nenhum outro vampiro; isso, longe de deixá-la frustrada, é um atrativo a mais para ela.
Os vampiros de True Blood possuem muitas características típicas da mitologia tradicional: possuem presas retráteis, que são ativadas quando vão se alimentar, quando estão excitados ou quando querem intimidar outro vampiro (ou humano). Eles podem hipnotizar, são fortes, movem-se com velocidade sobre-humana, alguns podem levitar e voar, suas lágrimas são sangue puro, têm alergia a prata e podem ser destruídos com a clássica estaca de madeira (ou outra arma feita desse material). Além disso, a luz solar é fatal para eles, fazendo com que entrem em combustão instantânea, a menos que ingiram antes da exposição um determinado tipo de sangue. E por falar em sangue, o dos vampiros é uma droga ilícita que possui fortes propriedades alucinógenas e afrodisíacas, sendo bastante cobiçado no mercado negro. Ainda falando em sangue, quando um vampiro morre, passa por uma metamorfose grotesca, desmanchando-se numa massa gosmenta de sangue e vísceras; nada daquele efeito “limpinho” de virar pó e evaporar visto em Buffy (comentada AQUI) nem aquele show de faíscas de Blade.
Em compensação, são “imunes” a símbolos religiosos, como crucifixos, o que vai de encontro ao fanatismo obsoleto da Irmandade do Sol (um grupo cristão radical), que prega a intolerância aos vampiros como criaturas condenadas, pecaminosas e satânicas, sem possibilidade de salvação em Deus. Essa questão do fanatismo religioso é explorada em tom de sátira na segunda temporada da série.
A cada temporada outros seres sobrenaturais vão sendo introduzidos na série, em tramas secundárias; alguns, já conhecidos, como lobisomens, fantasmas e bruxas, enquanto outros são bastante inusitados, como uma mênade e um Ifrit. Embora as últimas temporadas tenham desagradado grande parte do público, justamente por dar muito destaque às tramas secundárias e eclipsar o foco nos vampiros, como ocorria nas primeiras, True Blood ainda é uma série essencial a todo fã de tramas sobre os eternos bebedores de sangue: uma mistura de drama, romance, mistério, sátira religiosa, crítica social e política... e ainda consegue ser um soft porn sobrenatural!

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[QUADRINHOS] INTERVIEW WITH THE VAMPIRE (1991 - 1994)

         Publicada pela Innovation Comics, Interview with the vampire foi a primeira transposição do romance homônimo de Anne Rice para out...