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[LIVRO] CREPÚSCULO (Twilight, 2005)

terça-feira, 5 de junho de 2018.

          Cedo ou tarde chegaria a hora de falar sobre Crepúsculo, seja devido a frequentes comparações com outras produções literárias ou cinematográficas atuais sobre vampiros para o público jovem, seja simplesmente para destacar a abordagem e características peculiares conferidas por Stephenie Meyer a seus bebedores de sangue. Este post não irá dissertar sobre os dilemas adolescentes da Bella; o objetivo aqui é focar nas características vampirescas e no contexto delas no universo criado por Meyer. Assim deixarei de lado as sequências e irei me deter basicamente no primeiro livro, uma vez que as regras estabelecidas ali são válidas para as continuações da série.
          Para começar, vamos às características clássicas dos vampiros preservadas em Crepúsculo: são pálidos, possuem pele gelada e dura como mármore, têm força e velocidade sobre-humanas, beleza incomum e, claro, alimentam-se exclusivamente de sangue. Até aqui, essa descrição bem poderia ser aplicada aos vampiros de Anne Rice ou de Bram Stoker, só para citar as referências máximas em literatura vampiresca. Contudo, Meyer acrescentou e/ou alterou outras características, coisa que, se não agradou aos leitores tradicionais, merecem ser analisadas mais a fundo.
          Aqui os vampiros não dormem, não temem símbolos religiosos nem alho (contraste entre Stoker e Rice: tais apetrechos têm efeito no primeiro, mas são igualmente inúteis na segunda) e não temem a luz solar (situação contrária: o próprio Drácula passeia por Londres durante o dia, mas os personagens das Crônicas Vampirescas não têm esse privilégio). Aliás, essa questão da luz solar merece particular atenção; a regra de que os vampiros devem queimar ao sol é um conceito surgido com Nosferatu, de Murnau, em 1922. Até então os vampiros não apareciam durante o dia simplesmente porque eram seres noturnos e, como tais, precisavam dormir do amanhecer ao cair da noite, fosse para abastecer seu “poder maligno” (Drácula), fosse porque eram concebidos como assombrações que, portanto, poderiam atormentar “melhor” os vivos à noite, como os fantasmas supostamente fazem.
          Enfim, voltando a Crepúsculo, provavelmente o aspecto que mais indignou os leitores e tornou Edward e sua turma alvo de chacota e apelidos como “vampiro-fada”, foi justamente o fato de eles brilharem ao sol. Lendo o livro, dá para entender a justificativa parcial para isso: sendo esses vampiros extremamente pálidos e duros, é compreensível que sua pele reflita a luz, como ocorre em qualquer superfície clara, lisa e rígida, resultando nesse brilho. Entretanto, devo dizer que também não gostei desse efeito Globeleza; acredito que se a autora não queria adotar o efeito churrasco, uma vez que seus vampiros são diurnos, poderia simplesmente ignorar o fator sol, como ocorre na série de TV Being Human. Contudo, apesar das zombarias, esse brilho de diamante dos vampiros de Meyer me incomodou muito menos do que o fato de eles fazerem o ensino médio para sempre, colecionando chapéus de formatura ao longo das décadas, enquanto esperam encontrar seu verdadeiro amor humano. Isso para mim foi o ponto mais deprimente do livro, o ápice do tédio de viver.
          Agora, em relação ao sangue, elemento fundamental nas tramas vampirescas, há um grande equívoco quando se afirma que os vampiros de Crepúsculo são todos politicamente corretos e só se alimentam de animais. É necessário fazer uma distinção: os Cullen (família a que Edward pertence) seguem essa dieta vegetariana, mas o universo de Crepúsculo não possui apenas os Cullen. Na verdade, os únicos vampiros que seguem esse estilo de vida, além dos Cullen, são os Denali, seus “parentes” que vivem no Alasca. Todos os demais vampiros, desde os vilões até os que conforme as circunstâncias podem ser considerados “bons” seguem a dieta clássica de sangue humano.
          Outro aspecto curioso em Crepúsculo é o fato de alguns de seus vampiros serem X-Vampires, isto é, possuírem superpoderes que parecem saídos da turma da Marvel. Mais uma vez o livro explica essas habilidades: as características humanas são ampliadas quando alguém se torna vampiro. Assim, Alice, por exemplo, quando humana tinha uma espécie de percepção extra-sensorial, a qual foi aumentada a ponto de se tornar uma vidência parcial. Isto significa, portanto, que o vampirismo não “dá poderes”, mas amplia as habilidades latentes no indivíduo.
          Ainda há pontos que eu gostaria de destacar, mas além de tornarem o texto ainda mais longo, não se encaixariam necessariamente nas características dos vampiros, e sim a temas humanos e realistas, desde a escrita de Stephenie Meyer até a perspectiva da Bella sobre família, sexo e outros conceitos e descobertas que fazem parte da transição da adolescência para a vida adulta. Porém, como eu disse no início, este não é o foco aqui. Para quem tiver interesse nesses outros aspectos indico o livro Crepúsculo e a Filosofia, editado no Brasil pela Madras Editora. Constitui-se de uma coletânea de artigos referentes a vários temas e conceitos abordados na série de Meyer.


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